NÃO JULGUE UM LIVRO MENINO PELA
CAPA CARA
O que leva uma criança a adorar usar um capacete de astronauta, mesmo em
pleno verão? O que leva o diretor da escola Beecher Prep a criar um “comitê de
boas vindas” que favorece apenas um aluno? Pais superprotetores, outros
negligentes, pessoas extraordinárias sem ninguém para ver e um menino que não
passa despercebido em lugar algum: tudo isso e mais um pouco se relaciona de
maneira maravilhosa no primeiro livro de R.J. Palacio, Extraordinário (Wonder),
lançado em 2012 nos Estados Unidos.
August Pullman é a criança em
questão. O centro das atenções em casa, na escola e onde quer que vá. Seu
rosto, incomum, é capaz de despertar gritos de outras crianças e reações quase
repulsivas de adolescentes e adultos. Ingressante do quinto ano na Beecher
Prep, calouro na situação de estudar em escola pois passou os outros anos tendo
aulas em casa, August precisa de muita paciência e perseverança para enfrentar
o início do Ensino Fundamental II, o que é um pouco apavorante para qualquer
criança. August tem disostose bucomaxilofacial, uma anormalidade facial que o
submeteu a várias cirurgias.
De todo modo, não é que eu me
importe com o modo como as pessoas reagem a mim. Já disse um zilhão de vezes:
estou acostumado com isso a esta altura. Não deixo que me incomode. É como
quando você sai e está chuviscando. Você não calça galochas por causa de um
chuvisco. Nem sequer abre o guarda-chuva. Você anda na garoa e mal percebe que
o cabelo está ficando molhado.
(PALACIO, R.J. Extraordinário,
pag. 213-214)
Livro de estreia de R. J. Palacio, Extraordinário |
O menino é muito amado em casa pelos pais e pela irmã Via. Adora sua
cachorra Daisy, pois ela não tem repugnância dele. Na escola, Summer é uma das
garotas que se torna sua amiga por opção, e Jack Will não consegue resistir a
esse menino divertido. Julian, porém, é um dos alunos que escolhe tornar a vida
de August mais difícil. Imagine o primeiro dia de aula numa escola nova.
Imagine que tudo seria melhor se você tivesse amigos imediatamente. Agora
imagine uma criança nessas condições que ainda por cima tem um rosto “anormal”.
Imagine, sobretudo, os olhares de todos que o cercam. Essa é a vida de August
que tenta deixar o cabelo mais grande para que seu rosto não apareça muito, que
anda sempre de cabeça baixa para não ser notado e que, quando criança, usava um
capacete de astronauta sempre, porque, como um dos personagens reflete, as
pessoas achavam mais normal uma criança estar o tempo todo de capacete do que
ver o rosto de August.
Esse livro é incrível. Os capítulos são curtos, a história fluida,
personagens bem construídos, um teor melancólico sendo quebrado de instante em
instante por momentos de gentileza. É divido em partes, sendo estas narradas
por August, Via, Summer, Jack, Justin e Miranda, com frases de livros, músicas
e outros, sendo interessante ver o desenrolar dos acontecimentos sob várias
perspectivas. É ótimo ver como August enfrenta os desafios, como as pessoas que
o amam agem e tudo o que eu mais queria era que o final fosse feliz. A Veja.com
exemplifica a história na seguinte frase: “O ponto de vista de uma criança que,
ciente de sua estranheza e de seu deslocamento no mundo, cria um manifesto em
favor da gentileza”. Eu não poderia concordar mais. E não me importa que o
discurso do Sr. Bufanza (o diretor da escola) na formatura seja um tanto
clichê. Valeu a pena ter lido!
August é o Sol. Eu, a mamãe e o
papai giramos em volta dele. O restante de nossa família e de nossos amigos são
asteroides e cometas flutuando ao redor dos planetas que orbitam o do Sol. O
único corpo celestial que não gira em volta de August, o Sol, é Daisy, nossa
cadela, e isso porque, para seus olhinhos caninos, o rosto do August não é
muito diferente do rosto de qualquer outro ser humano. Para Daisy, todos os
rostos são parecidos, chatos e pálidos como a Lua.
(PALACIO, R.J. Extraordinário,
pag. 89)
No site da R.J. Palacio, a autora conta sua
inspiração. A inspiração é uma criança, menina, que estava perto de uma
sorveteria em certa ocasião. O filho de três anos da autora, ao vê-la, começou
a chorar muito alto. A menina tinha uma anormalidade craniofacial. Palacio se
afastou porque não queria magoar os sentimentos da menina, ao perceber que seu
filho se assustara. Na mesma noite, a música Wonder, de Natalie Merchant, tocou
na rádio. Assim nasceu o livro Extraordinário. Um livro de um menino que,
apesar de passar pela mesma situação quase todos os dias, às vezes ainda se
surpreende com as pessoas.
Doctors have come from distant cities just to
see me
Stand over my bed, disbelieving what they're
seeing
They say I must be one if the wonders of god's
own creation
And as far as they see they can offer no
explaination
(MERCHANT, Natalie. Wonder)
Escrito por MsBrown
Olá!!!
ResponderExcluirQue bacana ter você de volta... e o blog está de cara nova, hein! Maravilha!
Eu li esse livro recentemente, e pretendo publicar uma resenha, também. Gostei bastante da narrativa, do modo como a trama foi construída e, principalmente, da mensagem sobre o antibullying. Leve e sensível ao mesmo tempo. Gostei demais!
Adorei seu texto!
Abraços.
http://universoliterario.blogspot.com/
"Você anda na garoa e mal percebe que o cabelo está ficando molhado."
ResponderExcluirUau, olha, eu não lhe visitava há um bom tempo (bom tempo mesmo, rs), mas gostei da cara nova do blog, e dessa resenha fantástica. Já ouvi falar e muito desse livro (obviamente), uma amiga minha que leu disse que chorou muito lendo-o. Belíssimo, especialmente a inspiração da autora para o livro, achei um ato bonito da parte dela.
Abraços <3
ser-escritora.blogspot.com.br/